O desmatamento no Cerrado atingiu 652 mil hectares em 2024, uma redução de 41% em relação a 2023, quando foram registrados 1,1 milhão de hectares desmatados. Os dados são do RAD (Relatório Anual do Desmatamento no Brasil), divulgado nesta quinta-feira, com informações produzidas por pesquisadores do IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia).

Foto: SOS Cerrado
Apesar da melhora, bioma concentrou mais da metade de toda a perda de vegetação nativa do Brasil, superando em 42% a área desmatada na Amazônia, apesar de ser duas vezes menor |
Apesar da redução, o bioma ainda tem concentrado a maior parte da conversão de vegetação nativa, sendo responsável por 53% de toda a perda de vegetação nativa do Brasil no ano de 2024, além de acumular quase 4 milhões de hectares desmatados desde o início das medições.
Com exceção da Mata Atlântica, que registrou um aumento de 2% — explicado pelos eventos climáticos extremos que aconteceram no Rio Grande do Sul no final de abril de 2024, causando perda de vegetação nativa —, todos os biomas brasileiros apresentaram redução na área desmatada em 2024, em comparação com 2023. Na Amazônia, que tem uma extensão territorial duas vezes maior que a do Cerrado, foram desmatados 377 mil hectares — uma queda de 17% em relação a 2023 e 42% a menos do que a área desmatada na savana brasileira. A terceira posição no ranking ficou com a Caatinga, único bioma exclusivamente brasileiro, que perdeu 174 mil hectares no ano passado, uma redução de 13% em comparação com o período anterior.
No Cerrado, a tendência de queda foi observada em todos os estados do bioma, com exceção de São Paulo, que registrou um aumento de 56%. No entanto, o estado possui apenas pequenas áreas desse bioma. Apesar de uma redução de 35% em relação ao ano anterior, o Maranhão continua como o estado mais desmatado no Cerrado e no país pelo segundo ano consecutivo, com 218 mil hectares derrubados, sendo 208 mil hectares na porção de Cerrado. No Tocantins, por sua vez, a queda foi de 34%, totalizando 152 mil hectares desmatados. Considerando a extensão territorial e porção de Cerrado, a maior redução foi registrada na Bahia e em Goiás, com desmate de 126 mil e 50 mil hectares a menos do que em 2023, o que representa quedas de 65% e 72%, respectivamente.

Desmatamento anual do Cerrado mapeado pelo RAD. O projeto começou suas medições em 2019
“A queda expressiva do desmatamento no bioma Cerrado foi muito positiva. Em 2024, a seca impulsionou a propagação de incêndios e se o desmatamento tivesse aumentado a área queimada poderia ser ainda maior. Mas mesmo com essa redução, os números do Cerrado ainda chamam a atenção pela proporção, considerando que o bioma já perdeu metade da sua cobertura original e, apesar de ocupar metade da área da Amazônia, tem taxas de perda de vegetação nativa semelhantes”, ressalta Ane Alencar, diretora de Ciência do IPAM.
Além da área total desmatada, o Cerrado também registrou o segundo maior caso de desmatamento do Brasil em 2024: uma área de mais de 6,4 mil hectares foi derrubada na divisa entre os municípios de Sebastião Leal e Uruçuí, no Piauí. E 9 dos 10 maiores desmatamentos do país, estão no Cerrado. A área desmatada em menor prazo também está localizada no Piauí. Em Santa Filomena, 80 hectares foram abertos diariamente — o equivalente à perda de um Parque Ibirapuera a cada dois dias — ao longo de 12 dias, totalizando 964 hectares. A agropecuária é o principal vetor de desmatamento do Cerrado, respondendo por 99,6% da vegetação perdida em 2024.
Matopiba
Apesar da redução na área desmatada, estados e municípios do Matopiba — fronteira agrícola formada por partes do Maranhão, Piauí, Bahia e que abrange toda a área do Tocantins — continuam concentrando a maior parte das perdas de vegetação nativa no Cerrado. Em 2024, foram derrubados 492 mil hectares na região, 75% de toda a vegetação nativa perdida no bioma no período, embora o número seja 40% menor que o registrado em 2023.
Apesar da redução nos índices, o desmatamento elevado na região ainda preocupa pesquisadores, por se tratar de uma área que concentra os maiores remanescentes de vegetação nativa e nascentes fundamentais para o país. Além do impacto ambiental, a produtividade agrícola da região — focada em commodities como soja, milho e algodão — também vem sendo afetada por um clima cada vez mais extremo e imprevisível, tendo o desmatamento como uma das condicionantes.
“A agricultura tropical do futuro vai precisar de ter a vegetação nativa como parte do seu processo produtivo. Vamos ter que encontrar formas de integrar a natureza na produção de alimentos de forma sustentável, viabilizando assim a agricultura brasileira e de outros países tropicais num futuro em transformação por conta das mudanças climáticas. Temos hoje regiões do Cerrado em que foi registrado um aumento de 4°C na temperatura média. Isso significa que o cultivo de soja e milho nessas áreas já começam a perder competitividade. Precisamos, portanto, mudar o paradigma e enxergar a vegetação nativa como parte do sistema produtivo porque quanto mais floresta, mais produção e mais água”, defende André Guimarães, diretor executivo do IPAM.
Municípios
A lista de municípios que mais desmataram o Cerrado também é dominada por cidades do Matopiba. Juntos, os 10 municípios que mais derrubaram o bioma respondem por 18% de toda a vegetação perdida na região.
Na Bahia, mesmo com a redução de 65% na área desmatada, São Desidério voltou a ocupar a primeira posição do ranking como o município mais desmatado no Cerrado e no país, com 18 mil hectares derrubados. Já o município de Balsas, no Maranhão, teve 16 mil hectares de vegetação nativa suprimida, 57% a menos do que em 2023. Ao todo, dos 10 municípios mais desmatados, 3 estão no Piauí, 3 no Maranhão, 2 no Tocantins e 2 na Bahia
“Em 2024 o Matopiba concentrou mais desmatamento do que toda a Amazônia, lembrando que essa região é cerca de 7 vezes menor do que o bioma. Esse é um cenário que preocupa, já que o Matopiba é uma região chave para a conservação do Cerrado, visto que abriga grandes remanescentes de vegetação nativa do bioma, importantes cursos d’água, espécies da fauna e populações tradicionais. Continuar desmatando essa região é comprometer a diversidade de recursos naturais e vulnerabilizar as comunidades locais”, destaca Roberta Rocha, analista de pesquisa do IPAM.
Desde 2019, Balsas tem sido o maior desmatador do Cerrado. O município teve 131 mil hectares desmatados ao longo de 6 anos, o que representa uma perda de 13% de vegetação, considerando o total de vegetação nativa para o município em 2018. São Desidério, por sua vez, perdeu 127 mil hectares no mesmo período, o equivalente a 15% de sua vegetação nativa.
Sobre o RAD e MapBiomas Alerta
O RAD (Relatório Anual de Desmatamento) do MapBiomas reúne dados consolidados de desmatamento de todo o Brasil. Ele analisa os alertas de desmatamento detectados entre 2019 e 2024, e que foram validados e refinados sobre imagens de satélite de alta resolução pelo MapBiomas Alerta.
Nesta sexta edição, no Cerrado, os alertas gerados pelo DETER (Sistema de Detecção de Desmatamento em Tempo Real do INPE) e
SAD Cerrado (Sistema de Alerta de Desmatamento do Cerrado do IPAM), desenvolvido pelo IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia) e os alertas gerados nas regiões de transição entre os biomas, pelo SAD Caatinga (Sistema de Alerta de Desmatamento da Caatinga, da UEFS e Geodatin), SIRAD-X (Sistema de indicação por radar de desmatamento na Bacia do Xingu, do ISA), SAD Imazon (Sistema de Alerta de Desmatamento da Amazônia, do Imazon), SAD Mata Atlântica (Sistema de Alerta de Desmatamento da Mata Atlântica, da SOS Mata Atlântica e ArcPlan) e SAD Pantanal (Sistema de Alerta de Desmatamento do Pantanal, da SOS Pantanal e ArcPlan), foram utilizados para localizar os alertas de desmatamento nas imagens de satélite diárias de alta resolução espacial.
Todos os dados são
disponibilizados de forma pública e gratuita em plataforma web para que órgãos de fiscalização, agentes financeiros, empresas e sociedade civil possam agir para reduzir o desmatamento ilegal. O relatório completo com todos os dados está disponível no site do MapBiomas Alerta (alerta.mapbiomas.org).
Comunicação IPAM